Quem é o beneficiário do seguro-condomínio?
O contrato de “seguro-condomínio” revela-se tema, sem dúvidas, caro à administração do condomínio edilício. Afinal, segundo o Código Civil, é obrigatório o seguro contra o risco de incêndio responsável por causar a destruição, total ou parcialmente, do prédio (artigo 1346, CC). Sua relevância é acentuada pela realidade de mercado — a qual compreende a possibilidade de aumento da cobertura securitária obrigatória — e pela tendência social de buscar seguros para prevenção ou solidarização de riscos. Nessa perspectiva, revela-se cada vez mais comum a ocorrência de diversos fatos jurídicos naturais, até mais corriqueiros do que o incêndio — como, por exemplo, um vendaval, chuvas intensas —, configurarem um sinistro gerando direito ao capital segurado. Entretanto, ao receber tal montante, não raro surge a dúvida para o síndico e para o conselho fiscal: a quem pertence a indenização? De um lado, afirma-se com tranquilidade que é a partir da quota condominial que se custeia o prêmio do seguro, resposta cujo emprego do valor em benefício de todos os condôminos favoreceria. De outro, inexiste dúvida sobre a composição do condomínio edilício, formada por partes de propriedade comum e outras de propriedade exclusiva, principal característica do instituto, segundo o próprio artigo 1331, CC, bem como consolidada doutrina. Sendo assim, tal argumento seria hábil a assegurar o reparo dos danos à unidade individual. A resposta não se encontra positivada de maneira clarividente na lei, mas a norma regulatória indica o caminho a ser traçado. Neste sentido, a Circular Susep n° 620/2020 prevê que o seguro condomínio: “(…) destinado à edificação ou ao conjunto de edificações, abrangendo todas as unidades autônomas e partes comuns, destinadas a fins residenciais ou não residenciais”. Ou seja, a própria regra, infralegal, securitária remete ao conceito de condomínio edilício, consagrado expressamente no artigo 1331, CC. Com efeito, importante resgatar as noções da matéria para encontrar uma solução à problemática suscitada. Por meio de concepção basilares relacionadas às disciplinas de direitos reais e dos contratos, conclui-se inexistir qualquer razão dogmática que justifique vedar a destinação do capital segurado para recompor danos à propriedade particular. Segundo distinta perspectiva, determinadas situações tornam essa destinação verdadeiro dever da administração condominial. Há, contudo, inevitável preferência da reparação aos danos causados à propriedade coletiva. Dito em outras palavras, quando a reparação dos danos à propriedade coletiva exigir o emprego de todo o capital segurado efetivamente pago, sem restar qualquer valor capaz de indenizar o proprietário particular, a preferência supracitada opera a integralidade de seus efeitos. De outro lado, caso reconstruam-se as áreas coletivas do edifício, havendo a “sobra” de uma quantia supérflua, o saldo deve ser empregado na indenização dos danos particulares. Enfim, quando só a propriedade individual sofrer prejuízos, surgirá o dever de utilizar a indenização securitária para repará-la. Se não, veja-se. A preferência à indenização dos danos sofridos pela propriedade coletiva justifica-se pelo objetivo de garantir o interesse de todos os condôminos na manutenção do patrimônio comum, os quais, em última análise, contribuíram para o recebimento da indenização securitária. Isso porque o prêmio do seguro só é pago ante o pagamento das taxas condominiais. O emprego do montante indenizatório passa a realizar a mesma função primeira atribuída à cota condominial — a contribuição às despesas comuns (artigo 1336, inciso I, CC). De igual modo, há de se atentar à formação do contrato ora em estudo como fundamento da proposta defendida. Nessa linha, quando o condomínio celebra, por meio do síndico, o negócio securitário, terá dois objetivos claros, simultâneos ou independentes. Ou se busca obedecer a lei ou se pretende atender a vontade dos condôminos, expressa por voto majoritário em assembleia, ou busca se realizar os dois propósitos (afinal, em última análise, a lei pretende atender a coletividade de condôminos, além dos interesses sociais, ao exigir o seguro obrigatório). Logo, sem obrigação legal, nem a concordância da maioria dos condôminos que pretendam aumentar a cobertura mínima e cogente do seguro-condomínio, não há sequer título jurídico que justifique a validade e a eficácia do negócio ora analisado. Indenização securitária Diante das duas hipóteses mencionadas, sustenta-se a primazia do emprego da indenização securitária, paga como efeito jurídico da contratação de seguro-condomínio na recomposição dos danos à propriedade comum do edifício. Afinal, ao contratar o seguro obrigatório, o síndico está cumprindo um dos deveres cujo artigo 1348, CC (inciso IX) impõe. Com efeito, a leitura teleológica do dispositivo legal não deixa dúvida de que todas as obrigações ali impostas referem-se à tutela do bem coletivo dos condôminos antes de se proteger a propriedade individual considerada por si só. Segundo distinto viés, a decisão assemblear voltada à ampliação da cobertura securitária revela-se expressão da autonomia privada coletiva, destinada a resguardar a convivência geral dentro do condomínio edilício, bem como dos espaços físicos onde ela ocorre. Portanto, a recomposição de tais espaços revela-se função primordial cujo seguro contratado deve realizar. Assim, são as citadas noções basilares de direito condominial que orientam duas conclusões sobre o tema estudado, as quais, após desenvolvidas, ora se sintetiza. No entanto, fora dessas hipóteses, permite-se, também, a indenização aos danos à propriedade individual, conforme já se antecipou de forma breve. Mais do que isso, empregar o capital segurado desta maneira revela-se verdadeiro dever imputável aos administradores do condomínio, afirmativa que se justifica no conceito de causa do contrato entendida como função prático-econômica do negócio. Assim, primeiro, há de se apontar a qualificação do seguro-condomínio dentro de um dos tipos contratuais expressamente previstos no Código Civil, a saber: o seguro de danos (artigos 778 a 788, CC). Tendo em vista o entendimento de que a função prático econômica deste contrato típico é a proteção da coisa ou bem segurado contra riscos hábeis a destruir ou diminuir sua utilidade, o negócio específico ora estudado servirá, certamente, para essa finalidade. Logo, deixa de haver dúvida. Se o bem segurado é a totalidade das instalações do condomínio e o perfil funcional do contrato mencionado vincula-se à tutela dos danos que atingiram o objeto do seguro, isto significa a reparação de danos as áreas comuns e particulares. Tal conclusão se