O número de pessoas vivendo em condomínios vem aumentando ano a ano, por força da comodidade que oferecem, redução do número de pessoas nas famílias, elevado número de separações e, talvez acima de tudo, segurança.

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Segundo o Censo Demográfico do IBGE de 2022, atualizado em 2023, a proporção de apartamentos no país avançou mais de 4,1 pontos percentuais em 12 anos, saltando de 8,5% para 12,5%, e cresceu em todas as regiões e todos os estados.i Isto sem falar nos condomínios de escritórios e nos residenciais horizontais, que se expandem nas grandes cidades e em locais turísticos.

Ocorre que esta transformação social levou milhares de pessoas habituadas a uma vida plena de individualismo a ter que ceder às imposições de outra, com regras de convivência. O contraste leva a conflitos, por vezes fruto de ignorância, em outras de simples falta de educação, condôminos excêntricos ou até mesmo criminosos.

Os condomínios foram regulados pela Lei 4.591, de 1964, época em que a maioria absoluta da população morava em casas. Alguns artigos ainda estão em vigor, sendo que em 2002 entrou em vigor um novo Código Civil que, em vários capítulos, dispôs sobre a matéria.

O art. 1.333 fala da convenção que constitui o condomínio edilício, a qual deve ser subscrita pelos titulares de, no mínimo, dois terços das frações ideais. O regimento interno, doravante chamado de R.I., complementa a convenção e está previsto no art. 9º, § 2º da Lei 4.591/64. É bom lembrar que enquanto o regimento interno é mais focado em questões do cotidiano e da convivência entre moradores, a convenção abrange fatores maiores do condomínio, inclusive tratando sobre diretrizes administrativas.ii Muitas vezes o R. I. faz parte da própria convenção.

Obviamente, as situações são diferentes em um pequeno prédio com 6 apartamentos e um condomínio com muitas torres e centenas de moradias. Porém uma coisa é certa, os problemas não têm classe social, estão presentes tanto nos prédios populares como nos mais luxuosos condomínios.

Os direitos e deveres dos condôminos estão regulados nos artigos 1.335 e 1.336. Como os conflitos entre os condôminos são inevitáveis, o art. 1.536, inc. IV, expressamente prevê que a edificação não pode ser utilizada de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes.

Boa parte das controvérsias existentes já possuem jurisprudência consolidada nos tribunais, o que facilita a tomada de decisões por parte do síndico. Por exemplo, aluguel de imóvel pelo sistema AirBnB. Esta prática, que é internacional e relativamente nova, pode oferecer incômodo e risco aos demais moradores, já que o ingresso do locatário é praticamente livre, sem qualquer investigação além da comprovação do depósito. Neste tipo de contrato, o STJ firmou jurisprudência proibindo a locação, desde que haja cláusula vedando-a na convenção de condomínio.iii Portanto, aos condôminos que se sentem prejudicados, cabe cuidar para que a vedação seja inserida na convenção de condomínio, presentes 2 terços dos condôminos. Cabe lembrar que se não for proibido este tipo de locação e o locador alugar a pessoas que causem distúrbio no local, ele assume a responsabilidade civil solidariamente com o locatário.iv

Regra geral, as práticas que geram mais atritos são as seguintes:

  1. Lançamento de cigarros e de resíduos em condomínio vertical

É comum os regimentos internos proibirem cuspir, jogar papel, dejetos pela janela. Pontas de cigarros acesas acrescentam um perigo extraordinário, porque podem causar dano a bens de outros condôminos ou do condomínio, eventualmente até incêndio. A dificuldade é fazer a prova da autoria, pois dificilmente se sabe de onde foram lançados. No entanto, atualmente há câmeras que alcançam 20 metros no escuro. Por exemplo, a Canon anuncia a câmera de segurança MS-500, como a melhor captação de imagem no escuro, mesmo sem função infravermelha.v

  1. Excesso de ruídos dentro e além do horário permitido

Os ruídos nos condomínios verticais ou horizontais geralmente são de festas noturnas. Festas podem acontecer nas unidades e prejudicar diretamente os vizinhos mais próximos. A primeira medida é tentar conversar. Se não der resultado, o melhor a fazer é gravar com o celular o barulho e filmar-se em frente a um programa de TV que demonstre o horário. Em casos extremos, comunicar à Polícia e lavrar B.O. Posteriormente, comunicar ao síndico, com cópia do B.O. e arquivo da gravação e vídeo, para imposição de sanções. A vítima direta pode também propor ação indenizatória por danos morais, inclusive contra o proprietário, pois, conforme decidiu o TJMG, a responsabilidade civil é solidária.

Também é importante que os condomínios tenham nos seus R.I. o horário para terminarem as festas e, no salão disponível, qual o número máximo de convidados. Finalmente, nos condomínios de grande porte é bom que o síndico tenha e dê ciência aos condôminos do número de decibéis permitidos pelo município e compre um decibelímetro (R$ 108,90) para emergências. Por exemplo, em Curitiba, à noite permite-se até 50 decibéis e de dia, 55.

  1. Consumo e tráfico de drogas no condomínio, tanto na área comum quanto na privativa

O uso de drogas constitui crime previsto no art. 28 da Lei 11.343/206. Ainda que me pareça desnecessário, é recomendável que a vedação em área comum conste na convenção do condomínio. Câmeras com filmes serão provas fortes da prática da infração. Se ela for reiterada, a multa poderá ser fixada, com base no art. 1.337, par. único, do Cód. Civil, no décuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, por tratar-se de reiterado comportamento antissocial.

Caso o uso seja feito no interior de uma unidade, fato mais comum entre jovens, o melhor caminho é notificar os pais do usuário, alertando-os sobre a sua responsabilidade. Se for imóvel alugado, será oportuna a comunicação dos fatos ao locador, cientificando-o de que poderá ser responsabilizado administrativa e civilmente, com base no art. 1.336, IV da lei civil. Neste sentido a jurisprudência do TJSP.

Não surpreenderá a ninguém que um morador mais audacioso comece a negociar drogas no prédio, ainda que discretamente. Tal conduta configura o crime do art. 33 da citada Lei 1.343. Constatado o tráfico, tratando-se de pessoa sem periculosidade, o síndico poderá conversar sobre a situação, antes procurando obter provas, que podem ser filmes das câmeras, o número de pessoas que entram e saem do local e testemunhos, munindo-se de elementos para a imposição de penalidade. Em casos extremos, de risco de uma vingança violenta ou até mesmo fatal, deverá ser feita comunicação à autoridade policial. Não deverá, todavia, o síndico assiná-la sozinho, mas sim com os demais membros do Conselho.

  1. Lançamento de resíduos em área pública e descarte de lixo orgânico em local destinado ao reciclável

Por ignorância ou descaso, pessoas deixam resíduos nas áreas comuns, conduta sempre proibidas nos R.I., tornando o ambiente desagradável, permitindo proliferação de insetos e desvalorizando os imóveis. Além disto, muitos não separam lixo reciclável dos rejeitos inaproveitáveis, causando prejuízo econômico nas vendas posteriores de catadores de papel ou do próprio condomínio. Os resíduos sólidos são tratados pelo Lei 12.305, de 2010, a qual faz menção à reciclagem nos princípios e objetivos (art. 6º, XI, “a”). Pois bem, tais condutas devem ser combatidas e a segunda hipótese (lixo reciclável) colocada também no R.I. Mesmo se tendo consciência que a prova desta é difícil.

Outros tantos problemas podem surgir. Por exemplo: a guarda de explosivos no interior de apartamento. Em 24 de fevereiro deste ano, houve explosão de armas e munições de uso militar no interior de um apartamento em Campinas, causando incêndio de grandes proporções, as quais eram guardadas por um Coronel do Exército. Outro exemplo de risco é a realização de obras internas na unidade, que comprometam a segurança da edificação, fato proibido pelo art. 1.336, inc. II do Cód. Civil. Ainda, dejetos de cachorros em condomínios horizontais, hipótese de fácil apuração com a realização prévia de exame de DNA em todos os cães que nele moram e apuração posterior nos dejetos deixados. Não se trata de um sonho, mas sim de algo praticado em condomínios nos Estados Unidos, com a condenação do dono do animal ao pagamento da multa e o exame de DNA nas fezes.

Além destas, muitas são as hipóteses, como ameaças de morador multado ao síndico, ofensas na rede de whats app e até mesmo perseguição a uma moradora ou trabalhadora, fato este que pode configurar o crime do art. 147-A do Cód. Penal.

É preciso equilíbrio e ponderação aos condôminos e à administração do condomínio para enfrentá-los. O importante é: a) fazer constar as hipóteses mencionadas nesta pesquisa no R.I.; b) coletar provas de tudo o que possa ter interesse, guardá-las e compartilhá-las, para que fiquem à disposição, inclusive, de futuras administrações; c) em casos mais complexos, contratar assessoria jurídica especializada; d) em casos extremos, propor ação visando à expulsão do condômino indesejável, o que é reconhecido como admissível pelo STJ.

Last but not least, nos condomínios de médio e grande porte a criação de um Centro de Mediação, não obrigatório obviamente, destinado a promover tentativas de conciliação, com a participação de 3 ou mais proprietários que atuarão como voluntários, pode ser uma boa solução para muitos conflitos. Feito o acordo, lavra-se um termo que deverá ser obedecido pelas partes e, caso desobedecido, servirá de prova em eventual ação. Caso não haja acordo, segue-se como de costume.

Afinal, acima de tudo o foco principal deve ser procurar viver em harmonia com os condôminos e aproveitar as coisas boas do condomínio.

Fonte: Conjur

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