A assembleia anual de prestação de contas é um dos eventos mais importantes na gestão condominial. E, como bem se sabe, é comum que a aprovação dos documentos ocorra sem que eles estejam 100% prontos. Ou seja, trata-se de balancetes e documentos fiscais com lacunas ou que ainda não passaram pela aprovação antecipada do Conselho.

Para o advogado Zulmar Koerich, que atua há 20 anos no segmento condominial, mesmo que esta seja uma prática habitual em muitas gestões, ele classifica como uma atitude ilegal. O especialista defende que, apesar de a assembleia ser soberana nas decisões, não pode – de forma alguma, contrariar a lei.

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Zulmar Koerich

“A assembleia deve guardar para si a competência para decidir sobre as contas”. “A legislação é bem clara quanto às competências, devendo estas, em razão do princípio da legalidade, serem preservadas: o síndico presta as contas, o conselho fiscal emite parecer e a assembleia delibera sobre elas. Essa é a regra que deve ser observada. O que ultrapassa esse limite tem-se por inválido. Não há, na legislação, previsão em outro sentido e nem possibilidade de ser disciplinada de forma diversa em convenção ou por deliberação dos condôminos em assembleia”, pontua Koerich.

O advogado afirma que a prestação de contas merece a máxima atenção e cuidado, além de exigir um esforço de todos os agentes envolvidos. Desde o próprio sindico, passando pela administradora e também pelos membros do conselho. Dessa forma, a assembleia deve ser realizada com todos os dados, documentos e informações suficientemente precisas para serem expostos, analisados e deliberados acerca de sua regularidade ou não. Isto é, a assembleia deve guardar para si a competência para decidir sobre as contas.

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Assim, o advogado acredita que é possível que a assembleia de prestação de contas aprovada de maneira incompleta possa ser anulada. “Contas parcialmente aprovadas significam contas parcialmente prestadas, em descumprimento ao art. 1348, inc. VIII do Código Civil, que estabelece a obrigação de o síndico prestar contas em assembleia, pressupondo todo o exercício financeiro sob sua gestão”, explica Koerich.

André Luiz Junqueira

André Luiz Junqueira: “O síndico deve evitar submeter à assembleia contas incompletas para evitar ressalvas desnecessárias ou reprovação”. O mesmo pensamento é compartilhado pelo professor e advogado do Rio de Janeiro, André Luiz Junqueira

.Ele acredita que, mesmo que a assembleia possa escolher aprovar parte das contas do síndico, ela não pode delegar ao conselho – nem de forma parcial – atribuição que é de sua competência. Entretanto, diferentemente de Koerich, Junqueira não acredita na anulação total da assembleia. Ele entende que apenas a parte que delega para os conselheiros competência exclusiva da assembleia não tem efeito legal, devendo um novo encontro ser convocado para que se cumpra a função.

“Se a ausência de algum documento, alguma informação ou parecer do conselho impedir a devida aprovação de contas, a assembleia pode não julgar determinado período afetado e deixar para aprovar em uma assembleia futura. Dependendo do que estiver faltando, também é possível aprovar com ressalvas ou reprovar as contas. No entanto, o mais prudente é conceder prazo para que o síndico sane as pendências e deixe o julgamento para uma assembleia posterior, que deverá ser convocada em breve”, indica Junqueira.

Ainda como dica, ele destaca que, antes de o síndico submeter suas contas ao conselho e à assembleia, deve ele mesmo verificar cada pasta à procura de eventuais pendências. “Tudo isso com brevidade adequada para que o conselho possa fazer a mesma análise. O síndico deve evitar submeter à assembleia contas incompletas para evitar ressalvas desnecessárias ou uma reprovação de contas”, explica o especialista.
Walter João Jorge: “Se a assembleia votar as contas, independente do resultado da deliberação, cumpriu-se a previsão legal”

Entretanto há profissionais que contrariam essa linha de pensamento. Walter João Jorge Junior, especialista em direito imobiliário e atuante na área condominial há mais de 25 anos, é um exemplo. Ele considera que, perante uma assembleia convocada para votar as contas do síndico, os condôminos podem conscientemente transferir a capacidade decisória para uma outra pessoa, a exemplo dos membros do conselho. “Isso deve ocorrer dentro da livre capacidade dos condôminos, mediante deliberação da maioria simples dos presentes”, explica.

E para reforçar o seu argumento, ele lembra do art. 1.350 do Código Civil, que discorre sobre o dever da assembleia de votar as contas: “Não ferindo uma lei, o ato não é ilegal. Por isso, se a assembleia, devidamente instruída, votar as contas, independente do resultado da deliberação, cumpriu-se a previsão legal”, explica.

Além disso, ele acrescenta que o síndico deve estar apto a prestar contas perante a assembleia e preferencialmente ter domínio das informações a qualquer momento, mesmo após a assembleia, apesar destas não estarem sintetizadas no que chamamos de “balancete’. “Assim ele cumpre o seu dever, independentemente do que os condôminos deliberarem”, conclui o especialista.

Fonte de consulta e transcrição de texto e imagens: Jornal dos Condomínios – Santa Catarina – SC – Edição 254 – Fevereiro de 2023.

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